quarta-feira, 15 de junho de 2011

Liberta.



Enquanto um mundo caótico acontecia lá fora, dentro de seus pensamentos frenéticos ela se via caindo cada vez mais lenta e assustadoramente. Corpos esbarravam no seu, fazendo-a se desequilibrar e cair. Cair no fundo do abismo de dor que esperava com um sorriso, por ela. Vez ou outra, um par de olhos a fitava por dois ou três segundos. Mas ela não notava. Estava absorta em sua própria desgraça. Havia se enclausurado numa espécie de casca de proteção, onde não via, não ouvia, não sentia, não entendia nada além de sua cruel e conhecida dor. 
Não muito longe dali, já podia-se ouvir o ruído de um trem correndo pelos trilhos de metal. Estava na hora. Ela havia comprado o bilhete há algumas semanas, e não podia perder esse trem. Não podia.
Ela olhou o relógio. Faltavam pouco mais de trinta segundos. Respirou fundo. Finalmente iria partir.
"Ela vai mesmo fazê-lo...", pensou alguém que olhava por ela, de um lugar que ela não podia ver.
Nesse segundo, o mundo silenciou por um momento. 
Quando os rostos finalmente olharam para aquela alma destruída, ela já não estava mais ali.
Havia pego seu trem, sem atraso.
Seu corpo se encontrava nos trilhos. Uma mistura de metal, sangue e dor. 
Não, dor não.
A dor havia passado. E foi assim, que pela primeira vez em anos, aquela doce criatura sorriu. Estava liberta.